terça-feira, 1 de novembro de 2011

Reticências


Houve um tempo em que eu acreditava em tudo e em todos. Um tempo em que o riso das pessoas era verdadeiro, e saía facilmente. Os bons momentos e os amigos não eram esquecidos tão depressa, e o amor não acabava com o passar dos anos, e nem acabava com a distância, afinal, alguém disse que a distância não é empecilho pra amar, e houve um tempo em que realmente não era. Naquele tempo tudo era mais simples, tudo era real e incabável, e eu acreditava que ninguém jamais me abandonaria. Eu acreditava em todos os abraços e nas palavras que vinham leves e carregadas de ternura. Eu conseguia facilmente olhar pra dentro das pessoas e saber o que elas sentiam, o que queriam dizer, sem segredos, sem mistérios. Houve um tempo em que eu pude confiar de olhos fechados e de mãos atadas, uma época em que ninguém me dava as costas e não usavam as minhas palavras contra mim. As coisas eram tão mais diferentes. Não existia esse sentimento vulnerável que se dilui por qualquer coisa. Não existia a palavra saudade, porque não dava tempo de senti-la - a matavamos antes que ela pensasse em aparecer. Houve um tempo em que o amor nunca acabava, quanto mais se dava, mais se tinha, e uma vez que o "te amo" fosse dito, ele ecoaria por toda a eternidade. Houve um tempo em que os momentos especiais eram preciosos, e eram guardados antes de tudo na memória de cada um pra que jamais escapassem ou sumissem por aí. Eu esperava todos os dias que os meus amigos viessem dizer que se importavam e lembravam de mim, e que eu tinha algum valor pra eles. Eu preservava cada segundo junto das pessoas que eu amava, não deixava nada nem ninguém me fazer mudar e principalmente me fazer esquecer do que era importante pra mim. Houve um tempo em que cada detalhe importava e jamais os dias, meses e anos apagavam o que realmente tinha vindo pra ficar. Eu poderia chorar e sofrer que sempre alguém viria me consolar e me dizer que estava tudo bem, que tudo ia passar. Alguém sempre estaria de braços abertos pra me acolher, pra me ouvir ou pra me dizer alguma coisa que me fizesse rir. Tudo era tão diferente. Eu colocava a minha mão no fogo por certas pessoas, eu dava minha cara a tapa, eu corria riscos. Hoje nada me resta, apenas o choro silencioso que chega de repente e demora pra ir embora. Só restaram as cinzas e as fotografias de tudo o que eu vivi e agora não passa de uma distante lembrança. Só restaram as reticências que estão prolongando-se nas páginas sujas e velhas desse livro incabado.

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